A atriz Tauanne Gazoso preparou projeto com texto do grande dramaturgo Nelson Rodrigues para se apresentar com a ‘Valsa nº 6’, a dois públicos bem distintos de Campo Grande. A artista leva o espetáculo a detentas da penitenciária feminina da Capital, e, ao aberto público no Sesc Teatro Prosa, a partir do dia 16 de outubro,
O projeto “A Valsa em Lugares Esquecidos”, é idealizado e protagonizado por Tauanne Gazoso, propõe uma circulação inédita do espetáculo em espaços onde a arte raramente chega — e onde a escuta, o acolhimento e a beleza podem reacender o desejo de liberdade como posto pelo renomado e polêmico dramaturgo, romancista, contista, cronista e jornalista brasileiro, Nelson Rodrigues
Assim, o drama psicológico “Valsa nº 6”, ganhará novos sentidos ao ecoar dentro dos muros das penitenciárias femininas de Campo Grande, após iniciar circulação da peça, que começa com uma apresentação aberta ao público no Sesc Teatro Prosa, no próximo dia 16. Haverá intérprete de Libras e ingressos gratuitos disponíveis pelo Sympla, através do perfil do Sesc Cultura MS no Instagram (@sescculturams).
O espetáculo seguirá para as unidades prisionais femininas: no Estabelecimento Penal Feminino de Regime Semiaberto, Aberto e Assistência à Albergada de Campo Grande, em uma mediação cultural com as internas, acontecendo no dia 20, conduzida por Halisson Nunes e Tauanne Gazoso. E a apresentação teatral no dia 21. Já no Estabelecimento Penal Feminino Irmã Irma Zorzi, as mediações ocorrem em 22 de outubro, seguidas de quatro apresentações nos dias 23 e 24, uma por turno, voltadas exclusivamente às mulheres da penitenciária.
Ato político e poético
A artista avalia que o projeto “A Valsa em Lugares Esquecidos”, é Mais do que um espetáculo. Ele se propõe a ser um ato político e poético, ao adentrar espaços considerados invisíveis.
“A arte precisa ocupar todos os lugares e estar a serviço de todas as pessoas. O nosso papel como artistas é também buscar estratégias para levar o teatro a esses espaços e contribuir para a transformação social”, explica Tauanne Gazoso, que vive Sônia, a jovem que tenta reconstruir sua própria história em meio às lembranças e delírios provocados por um crime de feminicídio.
O título “A Valsa em Lugares Esquecidos” nasce dessa urgência de presença. “Associamos os ‘lugares esquecidos’ justamente à ausência do teatro nesses espaços. Conversamos com a Agepen e confirmamos que ainda não houve nenhuma apresentação teatral nas penitenciárias femininas de Campo Grande. Por isso, nosso gesto é também um ato de pesquisa e resistência”, complementa Halisson Nunes, que assina a preparação corporal e a produção executiva do projeto.
Em cena
Tauanne interpreta sozinha todos os desdobramentos de Sônia — a menina, a mulher, as vozes que a assombram e as memórias que tenta recompor. A atuação exige precisão e entrega total.
“A personagem transita entre planos da alucinação e da memória, e isso requer uma intimidade muito grande com o texto e com as imagens que ele provoca. A cada nova temporada, coisas diferentes emergem. É um processo vivo”, comenta a atriz.
Mais de sete décadas após sua estreia, “Valsa nº 6” continua atual ao tratar do feminino e da violência de gênero. “Durante o espetáculo, Sônia vive a transição entre menina e mulher, enfrentando conflitos que reverberam profundamente nas mulheres e no público em geral”, diz Tauanne.
Para Halisson, a escolha da obra é especialmente potente em Mato Grosso do Sul, Estado com altos índices de feminicídio. “A peça ganha um sentido ainda mais urgente quando apresentada a mulheres privadas de liberdade, muitas delas atravessadas por uma sociedade machista e seus efeitos”.
Mediações culturais
Além das apresentações, as mediações culturais visam promover o diálogo e o compartilhamento de experiências entre a atriz e as internas.
“O teatro é um encontro potente, em que o ator e o público expõem suas vulnerabilidades e potencialidades. É um espaço de liberdade, e falar de liberdade é essencial, especialmente em lugares onde ela é restrita”, reflete Tauanne.
Ela cita Cecília Meireles: ‘Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, não há ninguém que explique e ninguém que não entenda’.
Para Halisson Nunes, o impacto dessas ações ultrapassa o campo simbólico. “O teatro só acontece porque existe a relação entre ator e público. Quando essas mulheres são inseridas nesse processo e podem se reconhecer como protagonistas de suas próprias realidades, as transformações são inevitáveis”.
Serviço
O projeto conta com recursos da PNAB (Política Nacional Aldir Blanc), do Governo Federal, através do MinC (Ministério da Cultura), operacionalizado pela Fundac (Fundação Municipal de Cultura), da Prefeitura de Campo Grande.
Mais informações sobre o projeto pelo Instagram @valsaemmovimento, para se ver que o espetáculo reafirma o poder da arte de atravessar muros — físicos e emocionais —, abrindo espaço para que vozes silenciadas também dancem sua própria valsa