Falhas no monitoramento, uso indevido de medicação e imperícia na indução do parto fundamentaram a decisão do TJDFT
A Justiça do Distrito Federal condenou o Governo do Distrito Federal (GDF) por falhas graves no atendimento obstétrico prestado a uma gestante no Hospital Regional de Ceilândia (HRC), que resultaram na morte de um feto durante o trabalho de parto. A decisão, proferida pela 4ª Vara da Fazenda Pública, reconheceu a responsabilidade objetiva do Estado e fixou indenização por danos morais e materiais à mãe.
O caso ocorreu em julho de 2021 e expôs uma sequência de erros assistenciais que, segundo o juízo, violaram protocolos básicos de segurança médica. A gestante deu entrada na unidade com dores intensas e solicitou a realização de uma cesariana, mas a equipe insistiu na condução do parto normal. Minutos depois do nascimento, a mãe foi informada de que o bebê havia nascido sem vida.
Além do desfecho fatal, o processo judicial relata episódios de violência obstétrica, incluindo comentários maldosos feitos por profissionais de enfermagem, o que agravou o sofrimento psicológico da paciente.
Laudo pericial desmonta versão oficial
Em sua defesa, o Distrito Federal sustentou que o atendimento foi adequado e que o óbito teria sido um evento imprevisível. No entanto, essa tese foi afastada pelo laudo pericial, considerado decisivo pelo magistrado. O documento apontou imperícia na condução do parto e uma série de falhas técnicas que comprometeram diretamente a segurança do feto.
Entre os principais problemas identificados estão:
- Ausência de monitoramento fetal por um período de 54 minutos, em desacordo com a recomendação técnica de verificação a cada 15 minutos durante o trabalho de parto;
- Administração de medicação sem prescrição médica, contrariando protocolos hospitalares;
- Erro na indução do parto com ocitocina, apontado pelo perito como o fator determinante para o óbito fetal.
Para o juiz, ficou comprovada a falha do serviço público de saúde e o dano sofrido, o que torna desnecessária a comprovação de culpa individual dos profissionais envolvidos.
Responsabilidade do Estado
A condenação se apoia no artigo 37 da Constituição Federal, que estabelece a responsabilidade objetiva do Estado por danos causados por seus agentes. Assim, basta a demonstração da falha do serviço e do prejuízo causado ao cidadão para que surja o dever de indenizar.
O Distrito Federal foi condenado ao pagamento de R$ 75 mil por danos morais e R$ 2.300 por danos materiais. A sentença ainda cabe recurso.
Um problema estrutural
O caso reacende o debate sobre a qualidade da assistência obstétrica na rede pública e a recorrência de erros evitáveis. Dados citados no processo, com base em estudos nacionais e da Organização Mundial da Saúde (OMS), indicam que o Brasil registra números alarmantes de mortes associadas a falhas médicas, estimadas em cerca de 148 óbitos por dia.
Especialistas apontam que o monitoramento adequado durante o parto é um dos pilares da segurança materno-fetal. A ausência desse controle, como destacou a decisão judicial, equivale a “desligar o radar” em um momento crítico, transformando um procedimento que deveria ser assistido com máxima atenção em um cenário de risco extremo.
A condenação do DF, embora individual, expõe fragilidades estruturais do sistema de saúde e reforça o papel do Judiciário como instância de responsabilização diante de falhas que custam vidas.























